sábado, 28 de julho de 2007

Irmã Susana - Irmã Sorriso

Infelizmente só a conheci em Outubro de 2005, apesar de eu estar em Moçambique desde 2001.
O nosso primeiro contacto foi telefónico mas, uma vez em linha, “intimou-me” a ir de imediato à sua Escola de Mumemo que queria ver transformada em “Escola Profissional de São Francisco de Assis”
Apesar da agenda carregada acedi, espicaçado também pelo desejo de conhecer quem me impunha, de maneira tão pouco formal, este encontro.
O “meeting point” foi o posto policial de controlo, à saída da cidade e a senha e contra senha para nos identificarmos foi a marca e a matrícula das nossas viaturas.
Esperei um bom (e desesperante) espaço de tempo (agora compreendo que a Irmã Susana necessite de atrasos para dar andamento a tanta coisa!) mas espantei-me quando vi sair de uma desconfortável dupla cabine, uma freira, risonha e bem disposta, que por detrás de uma alegria contagiante esconde os anos que por ela já passaram.
Saudou-me efusivamente, como se já nos conhecêssemos há largos anos, disparando à queima-roupa que “iria precisar muito de mim!”
Passando para o meu carro, viajámos até ao local da sua escola (eu direi, da sua grande Obra) e cedo me apercebi da força tranquila que residia naquela Mulher, irradiante de simpatia, serena e determinada, que trabalha como quem nada faz. Que encara os desafios com um sorriso, que cumpre, cheia de coragem, a nobre tarefa de ajudar, ajudar sempre, os necessitados, os excluídos, os marginalizados, os doentes, os sem abrigo, pais e filhos, que recolhe nos seus braços as crianças que lhe são entregues ou que encontra sós, abandonadas, debaixo da copa de um cajueiro ou nas bermas das estradas deste vasto país.
A Irmã Susana é uma mulher de esperança e nela habitam também as esperanças legítimas de tantos e tantos moçambicanos.
As suas mãos tanto afagam as crianças do seu infantário como se erguem, em tom impositivo, para aqueles que merecem reparos. Por si passa tudo. Detém, nessas mãos, como que invisíveis cordéis que tudo fazem mecher, numa busca incessante dos caminhos do Bem.
Que bom é conhecê-la, Irmã Susana, Irmã Sorriso.

"Os Vascos"

Um amigo meu que já por aqui anda desde os tempos coloniais, profundo conhecedor da realidade africana, ao referir-se aos novos quadros que chegam de Portugal e que se apresentam muito engravatadinhos, de fato cinzento, gel no cabelo e sapatos espelhados, chama-lhes : "os Vascos".
-Porquê ? - indaguei.
-Porque vieram fazer a segunda descoberta de Moçambique - retorquiu.

quinta-feira, 26 de julho de 2007

Bilene II (2003)

Na "aberta", sentado na areia, olho a imensidão do Índico e vejo dois mares: ao lonje, um mar liso, sereno, apelativo e brando, que parece o prolongamento natural do lago sossegado que lhe está à ilharga; mais perto, junto à praia, um mar enrugado e bravio, certamente a protestar, em franjas de espuma que se espalha,violentamente areia acima, contra a presença de estranhos...

quarta-feira, 25 de julho de 2007

Casamento

Não esperava por esta.
Fui convidado para padrinho de casamento.
"Em Roma, sê romano" e, sendo aqui a vida tão ritualizada, procurei, junto da minha empregada, saber dos procedimentos correctos.
- "Bem" - começou ela de forma pausada e tipicamente africana - "na nossa tradição, ser padrinho é pesado, mas é uma grande honra. Em todas as cerimónias quem vai mandar é o padrinho; deve preocupar-se com as fotos, o enfeite para o carro dos noivos, o passeio, a cerimónia do lobolo, o bolo da noiva, a prenda, o copo de água servido na visita à casa da noiva, o aluguer do clube ou salão para a festa, marcar as horas, abrir e encerrar todos os momentos, assinar os termos. É pesado mesmo, patrão, mas não podes dizer que não a esses teus novos filhos, que muito precisam de ti".
Assim seja!

Praia do Bilene (2003)

As casuarinas,
saltam da areia
em explosões de vida.
As crianças acariciam
as sombras com brincadeiras
e gargalhadas.
O lago, debruado pelas dunas,
adocica a existência
e parece quebrar as angústias
de quem o olha

segunda-feira, 23 de julho de 2007

Criminalidade

Quando cheguei ao aeroporto ouvi os comentários habituais do motorista: "cuidado, isto está pior, há para aí muitos assaltos, nunca esteve assim, agora matam ... ".
Ontem, na leitura dos jornais, deparei com títulos de fazer estremecer: " Ausência de Estado" , " Crimes Violentos em Maputo e Matola continuam - Estado de Sítio", "Mafambise em Polvorosa", etc.
Dei de barato.
Hoje, no banco, mostraram-me a foto de uma assaltante perigosa que foi presa, mas, entretanto, já restituída à liberdade. Ouvi, agora, um comunicado da Embaixada Americana recomendando aos cidadãos daquele país a máxima prudência.
Olá!
"Olho vivo e pé ligeiro" é uma recomendação pertinente que anda comigo desde que aqui estou.
Pelo sim e pelo não vou, àmanhã, reinscrever-me no ginásio e marcar uma consulta no oftalmologista.

domingo, 22 de julho de 2007

Tabuada

De manhã, cumpri o ritual: comprei o jornal e fui beber café à pastelaria que elegi.
Num semáforo, dei pelo Carlitos que, como desalmado, corria ao lado do carro a gritar "patrão !, patrão!.
Parei!
-Então o que se passa? perguntei.
-Patrão, já sei a tabuada toda e quero receber os 500!
- 500? Estás tonto ou quê?
Avivou-me a memória:
-Patrão, eu nunca sabia a tabuada quando me perguntavas. Disseste que quando eu a soubesse toda me davas esse dinheiro.
Era verdade!
Começou o exame, nem uma só falha!
O grave é que não lhe paguei por falta, naquela hora, de tal quantia.
Pagar-lhe-ei àmanhã com juros.

Regresso

Novamente no Índico.
As acácias da minha rua empalideceram depois de um verão em que, generosas, se multiplicaram em milhares de flores escarlates que juncaram o chão e afofaram os passos dos indiferentes.
Irão repousar até Novembro.
Fico à vossa espera e, entretanto, recordar-vos-ei nas fotos que fui coleccionando.
Bom descanso!